O esgotamento profissional e social é inevitável durante este momento difícil, por Prof. Dr. Sthefano Atique Gabriel

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Burnout da pandemia

Prof. Dr. Sthefano Atique Gabriel*

Na Itália, epicentro europeu da pandemia do novo Coronavírus, a cidade de Bergamo, localizada próximo a Milão, na região da Lombardia, sofreu irreparáveis prejuízos devido as consequências sociais e econômicas da pandemia.

Em entrevista à BBC, o consultor de indústria farmacêutica Alessandro Consorti, italiano que mora em Parma, explicou a situação das famílias de Bergamo, considerada a cidade mais violentada pela pandemia em todo o mundo.

É um luto duplo, morrer duas vezes, não poder ver pela última vez alguém que foi querido, não realizar completamente a morte de alguém que você sabe que faleceu, mas não poder fazer nada. Essas pessoas morreram em completa solidão, sem o afeto dos queridos, tendo como companhia somente os outros doentes”.

Em todo o mundo, o panorama social que se desenvolveu durante a tentativa de controle da disseminação do novo Coronavirus foi caracterizado pelo irreparável trauma da inesperada perda de familiares devido as repercussões clínicas e sistêmicas da infecção viral.

O abalo psicológico certamente agravou-se com a imposição sanitária das novas medidas de controle social, como velórios restritos e com número mínimo de pessoas, caixões lacrados pelo risco da contaminação, fotos do caixão enviadas a parentes distantes antes da cremação, fronteiras intercontinentais fechadas não permitindo a despedida ao ente querido e o sepultamento coletivo.

Para a maioria dos empresários e dos trabalhadores em geral, o trauma imediato da falência organizacional, a aceitação sem questionamentos do fechamento de seus estabelecimentos, o sofrimento silencioso pela destruição dos sonhos e das conquistas familiares, o convívio próximo com o desemprego e a instabilidade econômica, a necessidade de reinserção no competitivo mercado de trabalho ainda em estagnação e a adaptação à nova realidade global sob a ótica da pandemia ainda sem controle vacinal aumentaram a incidência de sintomas de ansiedade e de depressão, depressão doença e comportamentos suicidas.

Para os profissionais da saúde que atuam incansavelmente na linha de frente do combate ao novo Coronavírus, a magnitude da pandemia expõe a fragilidade do ser humano frente ao inimigo oculto. Além do impacto social e financeiro, a responsabilidade de evoluir, medicar, socorrer e realizar procedimentos em pacientes infectados, apesar das orientações constantes de isolamento social e restrição domiciliar, impõe conflitos internos diários a estes profissionais.

Quantos médicos provavelmente contraíram o vírus durante o exercício de sua profissão e o transmitiram aos seus familiares?

Quantos profissionais foram desafiados a lutar contra a doença e durante o exercício de sua profissão desempenhar o papel de médico ou cuidador dos seus filhos, pais ou avós? Quantos profissionais apresentaram a temida e constrangedora sensação de desenvolver sintomas da doença após sua jornada de trabalho? Infelizmente, quantos agentes da saúde tiveram seu ciclo de vida precocemente encerrados durante a luta diuturna contra o inimigo viral?

O esgotamento profissional e social, característica marcante da Síndrome de Burnout, é inevitável durante este momento difícil em que vivemos. Apesar das evidências recentes sobre a redução do número de casos confirmados e do número de óbitos, dos sinais de reaquecimento econômico e da provável reabertura comercial, muitas pessoas ainda sofrerão as consequências psicológicas da pandemia, em decorrência do ainda obscuro período pós-pandemia.

 

*Doutor em Pesquisa em Cirurgia pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Pauloe coordenador do curso de Medicina da União das Faculdades dos Grandes Lagos (Unilago)