José Antonio da Silva, artista de grande importância para a região de São José do Rio Preto, ganha livro sobre sua trajetória

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Ao longo de 50 anos, Orandi Momesso tem cultivado um olhar apurado sobre a produção artística brasileira, construindo uma das mais relevantes coleções de arte do Brasil, de grande importância histórica e que continua a ser registrada em livros, de modo a ampliar o acesso do grande público a alguns dos principais nomes da arte brasileira e sua significativa produção.

No ano do centenário da Semana de Arte Moderna e do bicentenário da Independência do Brasil, ele presta uma homenagem a um importante artista cuja poética dos trabalhos ganhou lugar cativo na sua coleção, José Antonio da Silva (Sales de Oliveira, 1909 – São Paulo, 1996), com a publicação do livro Silva: um gênio na Coleção Orandi Momesso, que estará disponível a partir de 24 de março de 2022, nas principais livrarias e lojas de museu.

Com uma capa em que é reproduzida a obra Autorretrato (1973), o livro reúne 70 trabalhos deste artista que, em sua extensa produção, considerada primitivista por alguns, porém, em sua essência, reconhecidamente expressionista. Obras em sua maioria fotografadas por Luciano Momesso Alcântara, que liderou o processo de pesquisa, a concepção e a elaboração do projeto, a quem o livro é dedicado.

A publicação conta com textos da historiadora de arte Ana Paula Nascimento, do poeta Augusto de Campos (que lembra a admiração do rigoroso crítico e artista Waldemar Cordeiro ao reconhecer a importância da obra de José Antônio, Volpi e Luiz Sacilotto, pelo seu figurativismo do signo, na IV Bienal de São Paulo), de Olívio Tavares de Araújo (que foi o responsável pela curadoria da maior exposição do artista, realizada na Pinacoteca do Estado de São Paulo, em 1998, assim como da exposição na Pinacoteca da Associação Paulista de Medicina, por conta do seu centenário, em 2009), do artista Paulo Pasta (que reflete sobre a obra de José Antônio, um artista que “…não pinta a partir do que vê. Pinta a partir do que viu e viveu”, afastando-se de “um simples testemunho do real” ao construir “um real mais complexo e atualizado”.), do crítico de arte Paulo Venancio Filho (que o relaciona a Van Gogh, Bruguel e a Douanier Rousseau, de quem Picasso tinha uma obra na parede, assim como Volpi tinha do amigo José Antonio), além do próprio Orandi. A cronologia é de Fernanda Pitta. 

Com tiragens em português e inglês, o que era para ser um livro de colecionador passou a ser um trabalho de pesquisa mais amplo, reunindo muita documentação inédita disponibilizada pela família, como a obra Fotobiografia (décadas de 1970 e 1980), que agora faz parte da Coleção Orandi Momesso.

Nesta espécie de álbum autobiográfico, o artista revela sua trajetória, seus pontos de vista, seus colegas de profissão, suas rotinas, por meio de colagens, fotografias e registros organizados por ele. A história de José Antonio contada por ele mesmo, como ele gostaria de ser visto. A publicação também traz obras de importantes instituições, além de reproduzir a pintura com a qual foi premiado em 4o lugar na exposição da Casa de Cultura de São José do Rio Preto, Os bois (1946). 

José Antonio da Silva (Sales Oliveira, SP, 1909 – São Paulo, SP, 1996) foi um pintor, escultor, escritor e repentista autodidata, com pouca formação escolar, sempre chamando a si próprio em terceira pessoa de “o Silva”. Nasceu em uma fazenda em Sales Oliveira, interior de São Paulo, povoado próximo a Ribeirão Preto. Desde criança, mudou-se com frequência com a família, em busca de melhores condições.

Ficou alguns meses na escola e logo foi ajudar o pai nas atividades rurais. Em São José do Rio Preto, foi responsável pela fundação do Museu Municipal de Arte Contemporânea (1966), junto com a biblioteca daquela cidade, e, posteriormente, ajudou na criação do Museu de Arte Primitivista “José Antônio da Silva” (1980). Também gravou dois LPs, denominados Registro do folclore mais autêntico do Brasil, e publicou os livros Romance de minha vida (1949), Maria Clara (1970), Alice (1972), Sou pintor, sou poeta (1982) e Fazenda da Boa Esperança (1987). 

Ao retratar um país que, segundo ele mesmo, “não existe mais”, rural, periférico, de forma absolutamente original, José Antonio tornou-se uma muito importante referência na produção artística brasileira, chamando atenção para questões que continuam atuais, como as queimadas, a natureza e o meio ambiente, muitas vezes de uma forma nostálgica, sempre com grande força plástica e, ao mesmo tempo, evidentes posicionamentos políticos.

Com trabalhos remetendo a paisagens e ao seu próprio estilo de vida, foi descoberto, em 1946, na Casa de Cultura de São José do Rio Preto (SP), aos 37 anos de idade (continuou produzindo até os 90 anos). Na época, os professores João da Cruz Costa e Lourival Gomes Machado e o escritor Paulo Mendes de Almeida notaram o surpreendente potencial do artista.

Dois anos depois, realizou uma exposição individual na Galeria Domus, a primeira dedicada a arte moderna em São Paulo, com grande repercussão. “Aí, ele mostrou uma produção realizada entre 1947 e 1948, muito moderna, planar, com cores e temas fantásticos, bem diferente da sua primeira fase e das fases que se seguiram, como o pontilhado dos anos 1950 e os autorretratos dos anos 1970”, lembra Ana Nascimento. Daí em diante, ganhou mais visibilidade, quando suas obras foram incorporadas aos acervos do Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand (MASP) e do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP), além de ser introduzida em diversas coleções particulares, no Brasil e no exterior. Em 1998, dois anos após a sua morte, uma grande retrospectiva na Pinacoteca, em São Paulo, a maior exposição já feita com seus trabalhos até então, consolida definitivamente a sua obra.



“é dificil entender um artista, 

e mais difícil ainda 

Entender sua Arte. 

Eu pinto sempre retratando alguma 

coiza de conqreto e útil, 

principalmente os recantos 

Bello e Lindo do nosso Brasil – 

e da nossa vida e principalmente 

a vida rural brasileira. tudo quanto 

eu paseio e vivi criança, 

hoje eu Boto em minhas telas.”

José Antonio da Silva

Fotobiografia, décadas de 1970 e 1980

Em muitas de suas telas, Silva apresenta elementos como cafezais, algodoais e gado no pasto, sempre de forma muito espontânea. As pinturas deste gênio, segundo Orandi, despertam memórias da infância vivida no interior do Paraná, “para onde meus pais, guiados pela trilha cafeeira, tinham assentado residência numa região povoada por inúmeros filhos de imigrantes italianos, que então desbravavam o norte do Estado”. Foi na Pinacoteca do Estado de São Paulo, ainda adolescente, que o colecionador se deparou com a obra Luta de touros. “Aquele encontro ficaria gravado em minha memória, e nascia então todo meu apreço pela história e obra desse gênio da nossa pintura. Seus quadros foram me revelando os acontecimentos de meus anos de infância. Todo esse mundo, encontrava eu agora na obra de Silva e, a cada quadro que conhecia, aumentava o meu fascínio pela sua poesia. Para mim, sua linguagem desperta uma volta ao passado, onde encontro aquele universo perdido, cheio de emoções, como se o menino encontrasse seu brinquedo preferido que havia perdido”, revela Orandi. 

Sobre a Coleção Orandi Momesso

Construída ao longo de cinco décadas, a Coleção Orandi Momesso é um importante acervo de arte brasileira, reunindo cerca de 5 mil obras, relevantes trabalhos de uma grande diversidade de artistas, em praticamente todos os períodos da arte brasileira, incluindo clássicos, pré-modernos, modernistas e contemporâneos. Eclética, a coleção reúne obras desde as urnas funerárias pré-cabralinas até os dias de hoje, incluindo um relevante conjuntos de obras de arte sacra e arte popular. Frequentemente, obras da Coleção Orandi Momesso têm sido doadas para integrar o acervo de instituições brasileiras, como o MASP, a Pinacoteca do Estado de São Paulo e MAM.